Por palavra doce ou por pesadelo
saiba que estou acordado, e que engano
minha lucidez sem dia, mês e ano,
e que o vinho, não consigo entendê-lo.
Se não quero esse fumo, mas a névoa,
crio o meu idioma de sono e sonho,
entre cores que invento e que componho,
e acredito em tudo desde Adão e Eva.
Sou louco quando quero e quando indago
se existir percebendo é simplesmente
a maldita sensação de quem sente
as ventanias do céu sobre um lago.
Não acordo de minha claridade.
Sou tão solar quanto as sombras que faço,
e o leão que trago, destruo e traço
sem conhecer ao certo nome e idade.
Acredito em deuses como quem ama
(às vezes a paixão me rói o rosto),
e a alma fica em sangue cru e exposto
– e eu, caleidoscópio, giro na cama.
Tateio miragens (já estou perdido),
nada mais me chama pelo meu nome,
e a solidão à frente é sempre fome
do grito mais longínquo e já vencido.
E desdobro-me no avesso reinício,
só consigo inventar o que acredito,
e já não sei mais se é medo ou se é mito
o poema que constrói um precipício.