Correio Braziliense
Sábado, 7 de dezembro de 2002
LER DE PERTO
“Meu interesse é por poesia”, faz questão de deixar claro, logo de início, Felipe Fortuna. “Acho que o poeta tem condições de fazer crítica, tradição que remonta, por exemplo, a T.S. Eliot, embora também haja resistências. Drummond não reuniu em livro sua ensaística, João Cabral de Meio Neto reclamava de não ser crítico.” Autor de A próxima leitura, ele divide o livro em duas seções principais (os ensaios feitos para o livro propriamente, os ensaios publicados na imprensa), entremesclada por outra, dedicada à prosa de Dalton Trevisan, Mário de Andrade e Clarice Lispector. A crítica contida em A próxima leitura, portanto, olha principalmente para a produção poética. Há ensaios a respeito de Décio Pignatari, Cassiano Ricardo, Joaquim Cardozo, Cruz e Souza, mas principalmente um, “O Remorso dos Códigos”, faz mergulho intenso na poética negativa de Sebastião Uchoa Leite. A atitude de negação é, escreve Fortuna, “contínua e filosoficamente basilar” na obra do poeta. “O maior compromisso do poeta é que tudo faça sentido, nem que seja na forma inversa”, registra. Há também a tentativa de recuperação de gente esquecida, caso de Joaquim Cardoso. “Para mim, ele é um mistério”, diz Fortuna. “João Cabral fala seis vezes dele como importante e nenhum dos seguidores de João Cabral presta atenção a Joaquim Cardoso, que não faz parte nem do grupo dos modernistas, nem dos concretistas.” Na parte dedicada aos textos publicados na imprensa, aliada à natural concisão, existe um tom mais provocador, às vezes abertamente polêmico. No ensaio “Um Vício Antológico”, Felipe Fortuna combate as ideias de Heloisa Buarque de Hollanda ao organizar coletânea de poetas (Esses poetas, Aeroplano). “Acho um fracasso da Heloisa, ela não consegue estabelecer os grandes poetas da geração dos anos 90, simplesmente porque usa critérios extraliterários, tem uma percepção culturalista danosa, é regional, bairrista”, enumera.